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O ensino da matemática e o construtivismo

Sabemos que existe uma ampla gama de habilidades matemáticas que os alunos devem aprender no Ensino Fundamental, são conteúdos hierarquizados, ou seja, devem ser ensinados e aprendidos numa ordem, degrau por degrau, e a aprendizagem fica muito difícil se uma dessas etapas não é bem assimilada, comprometendo todo processo à frente.

 É diferente de outras disciplinas onde conteúdos e conceitos podem ser aprendidos isoladamente. Observo, principalmente nos últimos 10 anos que, houve um movimento para longe do modelo de transmissão de entrega de conteúdo e treino por modelos, ou o que foi referido como “você observa o que eu faço, e depois o faz”, para um foco no entendimento conceitual que é apoiado por abordagens de ensino construtivista.

É um grande dilema no Brasil. Os catedráticos trancados em seus ótimos gabinetes, longe da prática e dos alunos definem “como” e “o quê” vai ser ensinado. Aos professores é dito – em treinamentos hiper conceituais e nada práticos – que é necessário abandonar as práticas antigas, como, por exemplo,  o ensino tradicional da tabuada e divisão no formato tradicional e adotar novas práticas como a divisão por decomposição, demonstrando grande variedade de técnicas.  

Também é um dilema para os educadores, que são cobrados para apresentar o “ensino transversal”, nome bonito para desenvolvimento de conhecimentos e habilidades conceituais atrelado a outros conteúdos. Por exemplo, um tópico, como os padrões, poderia fazer com que os alunos explorassem padrões não apenas em matemática, mas também em Educação Física (jogos em equipe), Meio Ambiente (clima, história), Tecnologia (processos de medição usado ao projetar e construir). Olhando assim parece muito bacana mesmo! E realmente seria se esse aluno aprendesse o básico primeiro, e depois explorasse essas opções.

A priori o aluno deveria sair da primeira fase do ensino fundamental (5º ano) sabendo realizar as 4 operações básicas, entender conceitos de fração, unidades de medida como peso, metro e litro e resolver desafios matemáticos utilizando tudo isso. Entretanto, vemos cada vez mais crianças chegando ao 6º ano sem conseguir resolver operações simples, a maioria diz que aprendeu, mas esqueceu. As crianças estão falando a verdade!

Além do equívoco quanto ao construtivismo, que não é método, é uma filosofia, uma postura que se toma diante dos fatos, o modo que você aborda a criança e a construção do seu conhecimento. Também precisamos considerar que as crianças não são iguais, algumas têm mais facilidade para aprender e precisam de menos exposição aos estímulos, outros precisam de uma frequência maior, de treino intensivo, e talvez essa mesma escola construtivista esteja oferecendo estímulos padronizados para todos, na contramão de sua proposta.

Um pequeno número de alunos é identificado como tendo um transtorno específico de aprendizagem matemática (discalculia), configuram de 3 a 6% da população. Estudo dos autores Booker, Bond, Sparrow e Swan (2004) sugerem que a maioria dos alunos tem dificuldade adquirida, envolve fatores intrínsecos ou extrínsecos, mas é fato que essas crianças já no quarto ano desenvolvem barreiras emocionais e consideram matemática muito difícil, curiosamente esses alunos melhoram muito quando vão para as aulas de reforço, onde professores utilizam as velhas e boas práticas de ensino da matemática: treinar caminhos para chegar aos resultados.

Trabalhar as diretrizes do currículo dentro de uma proposta construtivista, ao mesmo tempo que acomodam a diversidade dos alunos em suas salas de aula, é um desafio enorme, entretanto, não podemos perder de vista o objetivo real desse currículo.

Os benefícios do ensino transversal não vão ocorrer se não assegurarmos uma compreensão e o domínio dos conceitos de base, onde a aprendizagem nova está ligada ao aprendizado prévio, com ampla prática guiada, são andaimes em direção ao domínio do cálculo básico, ou seja, o pensamento matemático é construído e, por isso, precisa de um processo controlado de estímulos, pelo tempo que a criança necessitar e até que ela seja capaz de realizar essas operações básicas de forma automatizada.

Em suma, matemática é uma atividade procedimental e não conceitual, pode ser utilizada para interpretar conceitos, mas, ainda é procedimento, passo a passo. Os tempos são outros, mas nem tudo que é antigo precisa ser descartado, não pelo menos até que desponte algo realmente melhor. Por fim, como estudiosa do desenvolvimento cognitivo dedico este artigo a todos as professoras das salas de reforço e recurso e pais que estão ensinando seus filhos utilizando as velhas e boas práticas de ensino culturalmente e historicamente acumuladas.

Referências

  • Booker, G., Bond, D., Sparrow, L. & Swan, P. (2004). Ensino de matemática primária. (3º ed.) Pearson Education.
  • Booker, G. (2004). Dificuldades em matemática: erros, origens e implicações. Em BA Knight & W. Scott (Eds.), Dificuldades de aprendizagem. Múltiplas perspectivas. Frenchs Forest, NSW: Pearson Education.
Gilmênia Bueno

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